terça-feira, 28 de outubro de 2008

O Suicida

Sentindo a brisa gelada que sopra na beirada do topo do prédio!
Passa por minha cabeça, sem que eu esqueça, uma vida cheia de tédio!
Mal dá pra ver o capacho que está lá em baixo com o nome do hotel!
Respiro fundo e penso no mundo que nunca me disse qual é meu papel!
Me jogo sabendo o que estou fazendo, finalmente, da minha vida!
E gosto da idéia de dar à platéia, minha morte crua e sofrida!
A calçada se aproxima e a nuvem acima de mim se afasta!
O último som que escuto é o baque surdo da minha vida gasta!
Todos me olham com asco e vivem seu fiasco também querendo pular!
Todos nesta história são suicidas sem glória, prontos para se jogar!

Heitor Godau – 28/10/2008

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Ultimato

O que acha tanta gente, tanta paz nesse mundo!
O que acha não importa, tanto faz tudo é imundo!
Se se importa com que eu digo não se importa com que eu falo!
Se importa um mendigo, quem se importa não tenho saco!

Tanto faz tua presença, não me importo com sua vida!
Quem se importa si é vendida, tanto faz a tua crença!
Cabeça vai cabeça fica não me ligo em detalhes!
Se a bondade é amar-lhes, que a maldade seja rica!

Dor de dente dor de estômago tudo isso é poema!
Minha alma tem um âmago e ele é o problema!
Que moderno tem a vida o que de vida tem o moderno!
Se os gêmeos são a rima, quem se importa o que é fraterno?

Heitor Godau -24/05/2006

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Será Que É?

Isso tudo é muito estranho, andei reparando que tudo está exatamente igual, as nuvens continuam a passar, o céu continua azul, as montanhas continuam altas, o mar continua salgado, a areia continua fina e solta, o sol continua quente e a noite continua escura. Tudo sempre igual, o rio continua correndo, e o lago parado, a água continua molhada, a terra continua marrom e a pedra continua dura. Tudo sempre igual, a grama continua verde e no outono as folhas continuam a cair, no inverno esfria e na primavera há flores, as ovelhas continuam dando lã, os cachorros continuam latindo, os gatos continuam miando, os bebês continuam chorando de fome, os mendigos continuam pedindo esmola e as árvores continuam crescendo e "TUDO" continua sendo "TUDO"! Mas apesar disso tudo, tudo está diferente, as nuvens não passam mais, o céu não é mais azul, as montanhas não são tão altas, o mar nem é tão salgado, a areia é grossa e pisada, o sol está mais frio e a noite ficou mais clara. Tudo está diferente, o rio não está mais correndo, o lago não fica mais parado, a água está secando, a terra está ficando branca e a pedra está amolecendo. Tudo está diferente, a grama está ficando marrom, e no outono nenhuma folha cai, no inverno faz calor e na primavera as flores morrem, as ovelhas estão eternamente peladas, os cachorros estão mudos, e os gatos piando, os bebês estão quietos, os mendigos ricos e as árvores estão raquíticas e "TUDO" não serve para "NADA"! Apesar disso tudo, "NADA" está igual ao que era diferente, e "TUDO" se diferencia quando continua igual!
"O VIVO CONTINUA MORRENDO DE AMORES PELO MORTO QUE ESTÁ VIVO EM SUA MENTE QUE SE MOVIMENTA PARALISADA. ESCUTANDO SONS QUE NÃO SAEM DE LUGAR NENHUM E SÃO DIRECIONADOS A ALGUM OUVIDO SURDO QUE AS ESCUTA E OBEDECE, NÃO FAZENDO O QUE ELAS MANDAM!"

Heitor Godau - 11/02/2005

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

O Louco e a Doutora

A vida te leva pra muitos lugares, doutora. Te traz sensações e sentimentos muito estranhos e diversos. Como agora, por exemplo, a vida te trouxe até esse hospital psiquiátrico, te trouxe até minha cela, e te apresentou a mim, doutora. Isso foi há 6 anos atrás. Todos as noites, durante esses 6 anos, você visitou minha cela pra saber se eu não ia me matar de madrugada e eu nunca falei. Alias, desde que eu estou aqui eu nunca abri minha boca pra falar com ninguém, mas agora você ta me ouvindo falar, doutora. E pela sua cor deve estar bem espantada.
Mas como eu estava dizendo, a vida faz isso com você, mas ela também pode te ignorar. Assim como me ignora e ignora você também, doutora. Você trabalha aqui por que não tem mais ninguém lá fora pra você. E eu vim me “hospedar” aqui, porque não quero ninguém lá de fora. Sabe, doutora, eu consigo ver a alma das pessoas, eu vejo a minha, vejo a sua e vejo a de todos que estão lá fora, eu escuto o que eles trazem bem no fundo da mente. E vai por mim, não é toda essa bondade que eles trazem por fora. É cruel, doutora, muito cruel. Suas verdadeiras vontades, seus verdadeiros prazeres aprisionados, tudo é muito cruel. O que me deixou louco, não foi ver dentro da minha alma, foi ver dentro da alma dos outros. Tem a garota que adoraria furar os olhos das pessoas no ônibus, tem a menininha perturbada que adoraria esfaquear o gato, tem o cara que sentiria prazer em torturar os outros e por aí vai, doutora. Eu já estou aqui há tanto tempo, que ninguém mais sabe como eu cheguei aqui, todos os funcionários que trabalhavam aqui quando eu cheguei já foram trocados. Faz tanto tempo, que nem eu mesmo lembro como cheguei aqui, não lembro nem do meu nascimento, mas eu sei que faz tempo. Não sei muito bem porque eu, nem como, nem de onde veio isso, mas eu estou vivo a muito mais tempo do que você imagina, doutora. Eu envelheço muito devagar, eu vi a segunda guerra mundial, vi a primeira, vi quando apareceram com a eletricidade, vi quando todos resolveram se lançar ao mar pela primeira vez, vi quando Roma ainda estava no auge do império e ve ela arder em chamas, na época de Roma eu ainda era um garoto. Quanto mais o tempo passa, mais devagar eu envelheço e não sei até onde isso vai chegar.
Acho que já chega de falar né, doutora. Pois bem, meça meu pulso, olhe nos meu olhos com sua lanterninha, cheque minha garganta como você sempre fez nos últimos 6 anos. A última vez que falei com alguém antes de hoje, já deve fazer uns 20 e tantos anos, ou mais...depois de viver tanto, eu já não consigo mais entender como o tempo passa. Bom, isso era tudo que eu tinha pra falar e não perca seu tempo esperando me ouvir falar de novo com você.

Heitor Godau – 13/11/2007